sábado, 8 de março de 2025

À minha Mãe

 

Fig. 1 – Flora, a minha mãe com 20 anos


Neste espaço que dedico às memórias do passado de travanca, quero partilhar uma muito especial e pessoal, a história de vida da minha mãe. Não porque tenha tido relevância no panorama de Travanca de Lagos mas porque teve toda a relevância e importância na minha vida.

Foram 83 anos de vida, para nós partiu cedo deixando um grande vazio nas nossas vidas, mas com a convicção de ter partido de coração cheio. Voltou para a Terra que a viu nascer, num lindo dia de sol, 4 de março de 2025, junto com a família, amigos e conhecidos e acompanhada pela secular Irmandade de São Pedro. A todos agradeço por essa última homenagem!

Como sabem, a minha mãe chamava-se Flora (fig.1), um nome diferente mas que sempre adorei! A inspiração para o nome, segundo sei, foi de uma amiga brasileira da minha avó Maria Cerca, chamada Flora (fig.2), que estaria temporariamente na casa de Luís Martins Borges, onde a minha avó trabalhava. Teve 3 irmãos e um pai que se ausentou quando ela tinha apenas 2 anos.


Fig. 2-  Flora
         Fig. 3 -  Entroncamento, fins dos anos 40 ( a minha mae, 2ª da dta.)


A nossa família vivia um período muito difícil de privação e pobreza, num país pobre e num contexto de 2ª guerra mundial e pós guerra. Talvez por isso saiu ainda muito nova de travanca, com apenas 9 anos, foi servir para a família do Dr. Álvaro Madeira em Coimbra- hoje seria considerado trabalho infantil - pouco tempo depois de concluir a escola primária. Teve portanto uma infância pouco feliz e uma vida difícil nos primeiros anos.

Fig. 4 – Aniversário dos 59 anos de casamento, 29/8/24

Mas cedo encontrou um novo rumo, quando conheceu o grande amor da sua vida, um homem que a amou desde o primeiro dia e que levaria a uma vida comum de mais de 60 anos. Foram um binómio até ao último dos seus dias, um amor incondicional. Quem os conheceu sabe do que falo, os meus pais foram feitos um para o outro!


 

Fig.5 – Dia do seu casamento, 29/8/65                                                  Fig.6 –Fim dos  anos 60

A sua vida não aconteceu sem sacrifícios, trabalhos menos qualificados, passando por um período de emigração na Alemanha, onde trabalhou, entre outros, numa fábrica de produção de peças automóveis, em schaffausen, perto de Singen, cidade do sul de Alemanha, onde residíamos. Não deixaram de ser tempos felizes também, com muitas amizades novas num país de novas oportunidades.

Fig. 7 – Alemanha , Singen 1977

De regresso a Portugal, estiveram para se fixar em Travanca, mas acabaram por escolher Coimbra, a sua terra de coração, corria o ano de 1979. Aí construíram uma moradia, na Casa Branca, bairro da Monac, como era designado então, chão de antepassados meus. Aí viveu cerca de 45 anos até ao seu último dia.



 Fig. 8 – Colegas do Jardim                                      Fig. 9 – Um dia de trabalho no João de Deus, 1999

Em 1980 foi inaugurar o 2º jardim-escola João de Deus, na Solum, primeiro como empregada mais básica e finalmente como chefe de economato, cargo que desempenhou até à sua reforma em 2006. Criou muitas amizades entre colegas e professores, pais e educandos. Eu costumava dizer que a minha mãe tinha muitos netos em Coimbra para além dos seus, pois mantinham-lhe o afeto muitos anos depois de saírem da primária, com visitas constantes. Quando fez 25 anos de serviço foi agraciada e homenageada na sede em Lisboa pelo presidente da direção da Associação de jardins-escolas João de Deus, o Dr. António de Deus Ramos Ponces de Carvalho, que a deixou muito orgulhosa. Mas acima de tudo trabalhou para os filhos e netos, 4 que ajudou a criar, com muita dedicação e um amor incondicional. Todos temos memórias maravilhosas.

Fig. 9 – Homenagem em 2005


E como não podia deixar de ser, filha de cozinheira sabe cozinhar! Cozinhava maravilhosamente, eram conhecidos por toda a família e amigos os seus pratos de cozinha tradicional Portuguesa, como o rancho, a feijoada, o cozido ou o cabrito assado, que não tinham igual. Dou 2 exemplos: feijoada com arroz de bacalhau e esparregado de nabiças, parece estranho mas era sublime ou a típica carne estufada com cenoura e nabo, simplesmente divinal! Já os netos e os seus amigos não esquecem as almondegas e os morangos com chantilly!

 
 

Fig.10 a 13 – últimos 2 anos


Nos últimos anos, fruto de um processo demencial, a sua saúde foi-se deteriorando progressivamente, embora que, até ao seu último dia tenha mantido sempre a boa disposição junto da família e principalmente do meu pai, agora também o seu cuidador extremoso, que nunca lhe faltou com amor nem coisa alguma. Apagou-se a luz mas ficam as memórias de todos nós!


Fig. 14 – Último aniversário 12/11/2024