segunda-feira, 27 de outubro de 2008

No tempo de João Brandão - Cap. 1



Midões, na 1ª metade do séc. XIX, foi o centro nevrálgico das movimentações políticas e lutas partidárias. Era sede de concelho e gozava de um estatuto importante na região.

Entre 1828 e 1834 imperou em Portugal D. Miguel, o rei Absoluto. Nessa época os partidários do liberalismo foram perseguidos e presos. Dessa facção faziam parte a família dos Brandões, que na época estava dividida em dois ramos - os Brandões de Midões e os Brandões do Casal ( da Senhora). Desta última, Manuel Rodrigues Brandão era o seu representante e era também pai do famoso João Brandão.

As perseguições movidas pelos Absolutistas levaram na época, Manuel R. Brandão e três sobrinhos dos Brandões de Midões a andarem fugidos, a monte durante meses com medo de serem presos ou mortos.

Quando estalou a guerra civil em 1832/34, saíram vitoriosos os Liberalistas. Seguiu-se um período de desordem e vinganças, acrescido ainda do nascimento de bandos de guerrilheiros, que não se quiseram desmobilizar da guerra. Eram sobretudo Miguelistas vencidos, mas também ex-combatentes, apenas com o objectivo de roubar e matar, fazendo disso o seu modo de vida.

Um exemplo paradigmático era a quadrilha do "Caca" , vulgo os "Garranos", responsáveis por inúmeros assassinatos, de entre os quais, a morte do padre Figueiredo de Fajão, tendo-o obrigado a andar pelas ruas descalço e cortando-lhe por fim as orelhas, ou o caso do padre de Castanheira, que o foram buscar ao altar onde estava a dizer a missa e o mataram. Haviam ainda outros grupos de guerrilhas: - os poetas de Sameice; os Crespos de Lagos; os Calistos da Lagiosa; Agostinho Vaz Pato de Abreu e castro de Santa Ovaia; Padre Joaquim de Carregoselo, que levava tudo diante de si a ferro e fogo; Estanislau Xavier de Pina, etc..

Nessa época, referente a Travanca de Lagos surge um nome - Manuel da Silva. Era um sicário do bando Brandoático, de Manuel R. Brandão - Brandões do Casal (nessa época João Brandão era pouco mais que uma criança).

De entre outras "façanhas" de que Manuel da Silva foi incriminado, contam-se a morte horrorosa do vigário do Ervedal (que mais tarde se vieram a descobrir os verdadeiros culpados) e esteve na Matança da Páscoa, que consistiu no cerco ao bando do Caca no seu quartel general , que se tornou Lagares. Foi assassinado por Manuelzinho Brandão, primo de João Brandão, tendo sido cúmplice o seu irmão Francisco Elísio.

Com efeito, após a chamada revolução de Setembro de 1836, houve divisão entre os liberais: - os Cartistas, defensores da carta constitucional- Brandões do Casal, mais conservadores; os Setembristas, defensores da Constituição de 1822, mais radicais -Brandões de Midões.
Os Brandões do Casal e os de Midões tornaram-se assim inimigos mortais, perpetuando o ódio e a matança ainda por muitos anos.

quarta-feira, 24 de setembro de 2008

Ode d'além


Travanca de Lagos 
Rústica,
Antiga e afamada,
Villa
Arcana
Nasceste
Celta
Árabe ou Romana?

De

Longe te vem
A
Glória
Oh!
Splendidíssima Travanca!

sexta-feira, 12 de setembro de 2008

Recordação do Bussaco





Para alguns esta fotografia não constituirá nenhuma novidade ou, por outro lado, pode não revelar qualquer interesse. Mas se eu disser que estamos perante uma fotografia dos anos 30 do séc. passado e marca a passagem pelo Bussaco de uma excursão de Travanca de Lagos? Aí o caso pode mudar de figura. É claro que é essencialmente uma foto de familia, pois reconheço alguns parentes meus. Por exemplo, na janela da esquerda estava o meu tio Manuel da Costa, conhecido como Manel  "Pópó", segue-se uma criança que desconheço, depois uma minha tia, Ana dos Prazeres Abrantes e logo depois a minha bisavó Maria Nazaré Costa. Por último, na janela da direita estava o meu avô, Artur Francisco Pereira. Também em 1º plano à esquerda, de joelhos, parece ser o meu tio Raúl da Costa e em pé a 4ª da direita é a minha Tia Margarida Nazaré da Costa, com menos de 20 aninhos. Não reconheço mais ninguém, mas achava engraçado que se descobrisse quem eram. Deixo aqui este desafio.

segunda-feira, 8 de setembro de 2008

As Invasões Francesas de passagem por Travanca de Lagos




Na passagem dos franceses em 1811 pelo concelho de Oliveira do Hospital, Maria Emília do Socorro Pinto Ribeiro Tinoco, nascida em 1789, e duas tias, Maria Teresa de França e Ana Angélica de França , ( filhas de Bento Ribeiro Pinto , que foi juiz ordinário de Oliveira do Hospital ), fugindo da quinta das Vinhas Mortas, onde viviam, para Travanca de Lagos, foram atacadas pelos Franceses na quinta do Pedrógão em Travanca. As tias morreram e ela, apesar de atingida, escapou por ter sido considerada morta. As Tias foram sepultadas na Igreja de Travanca de Lagos.
JDuarte

sexta-feira, 5 de setembro de 2008

O caso do pároco de Travanca de Lagos



AS FARPAS

CHRÓNICA MENSAL

DA POLÍTICA, DAS LETRAS E DOS COSTUMES

TERCEIRA SÉRIE TOMO II Fevereiro a Maio 1878


RAMALHO ORTIGÃO--EÇA DE QUEIROZ























As farpas são uma das mais conhecidas e mordazes publicações satíricas de finais do séc. XIX, escritas por Eça de Queirós e Ramalho Ortigão e publicadas em fascículos entre Maio de 1871 e 1872, altura em que Eça abandona a publicação, mas continuando a ser escrita por Ramalho até 1882.
“São uma admirável caricatura da sociedade da época. Altamente críticos e irónicos, estes opúsculos publicados entre 1871 e 1872 satirizam entre outros, com requintado e inteligente humor, a imprensa e o jornalismo partidário ou banal; a Regeneração, e todas as suas repercussões, não só a nível político mas também económico, cultural, social e até moral; a religião e a fé católica; a mentalidade vigente, com a segregação do papel social da mulher; a literatura romântica, falsa e hipócrita. Coligindo os opúsculos mensais da capa alaranjada e decorados com o diabo Asmodeus - o génio impuro de que falam as Escrituras - e que a cada número se esgotavam nas bancas de Lisboa (o primeiro número esgotou uma primeira edição de 2000 exemplares).”

Pois bem, nesta III série, vem em destaque um episódio muito curioso que se passa em Travanca de Lagos. O caso relaciona-se com o pároco de Travanca que, provavelmente, seria o prior José Mendes Abreu e Costa. A seguir transcrevo o texto integral que diz respeito a este episódio e tal como os autores na época, escuso-me a acrescentar comentários desnecessários.

“Deram-se ultimamente dois casos profundamente característicos: o caso de Joanna Pereira e o caso do parocho de Travanca de Lagos.
No caso de Joanna Pereira vemos três reos confessos e convictos de três crimes: Joanna, de adultério; Carlos, de tentativa contra o pudor por meio da chlorophormisacão; o carroceiro, da remocão de um cadáver; todos três cúmplices e conniventes no crime de cada um.

Como procede a sociedade? Não tomando conhecimento de nenhum d'estes attentados e despedindo os reos em paz!

No caso do parocho de Travanca de Lagos, o réo e accusado de ter falsificado uma certidão de edade para o fim de salvar um mancebo do recrutamento militar. Como precede a sociadade? Condemnando o parocho a oito annos de degredo para a costa ds Africa!

O primeiro caso e um tríplice attentado contra a ordem social. Asociedade não só o não pune mas nem sequer o julga.
O segundo e uma contravencão de um regulamento administrativo. A sociedade não só o julga mas pune-o com uma das máximas penas do código.

* * * * *
Não analysamos o procedimento havido com Joanna Pereira e os seus co-réos. Pomol-o simplesmente em parallelo com o procedimento havido como parocho de Travanca de Lagos, e dizemos que a condemnacao d'este e uma iniquiedade monstruosa.
O crime do que é accusado o padre, condemnado por havel-o commettido a oito annos de degredo, e crime unicamente perante a letra de um regulamento de carácter não só transitorio mas arbitrario--o regulamento do serviço militar.

O parocho foi condemnado por tentar salvar do serviço um recruta. Alterar um número, escrever um algarismo por outro, so pode involver intencão criminosa quando d'esse acto proceda uma offensa de interesses.

Viciar a data de uma letra ou de um contrato e indubitavelmente um grave crime, porque offende o interesse do commercio, ou o da indústria, ou o da propriedade. Mas alterar a data de uma certidão de baptismo, para o facto de isemptar do serviço militar um cidadão, nao é offender um interesse social; é o contrario d'isso: é servir o interesse que todas as sociedades teem em que deixe de haver militares.

* * * * *
O crime, no estado de pura tentativa, pelo qual o padre foi julgado opunido com degredo de oito annos, se se chegasse a realisar e se estendesse do caso particular de uma freguezia do reino a todos os casos análogos na Europa inteira, seria o mais assignalado dos benefícios à civilisacão e à humanidade. Daria em resultado a eliminacão do militarismo e da guerra.

Os crimes pelos quaes Joanna Pereira e os seus collaboradores não foram punidos nem julgados, se se estendessem da casa da travessa da Oliveira ao resto da sociedade, dariam os seguintes effeitos:

Os cadávares seriam propriedade dos carroceiros, o que acabaria, de uma vez para sempre, com o uso dos cemitérios e com a prática de enterrar os mortos.

Os Antonys teriam ao abrigo das leis, um desenlace inoffensivo para todos os seus dramas: _Resistia-me, chlorophormisei-a!_

Finalmente, para o facto da seleccão da espécie, os maridos seriam substituidos pelos mestres de piano dados ao abuso das bebidas alcoolicas--o que tornaria o casamento inútil e a familia impossível, convertendo aos pianos, reforçados pela aguardente, nos únicos instrumentos da perpetuidade da raça.

* * * * *
Expond0 simplesmente os dois casos referidos e o modo como a sociedade os resolveu, achamos inútil accrescentar commentarios, e fazemos unicamente à sociedade os nossos cumprimentos.”
Jduarte

segunda-feira, 1 de setembro de 2008

Antiga casa da Família Álvares Brandão de Travanca de Lagos


O tema desta casa é recorrente neste Blog mas, compreenda-se, neste espaço está tudo relacionado – história, poesia e património. Claro que foi também a casa onde a minha avó viveu quase 30 anos (numa versão reconstruída), portanto, uma casa também muito especial para mim.

Remonta, provavelmente, ao último quartel do séc. XV, construída por Álvaro Afonso Brandão quando este se casou com Catarina Vaz, que era natural de Travanca de Lagos.

Álvaro Afonso Brandão, nasceu em Midões por volta de 1450, pessoa nobre, de acordo com o processo de Habilitação ao Santo Ofício do seu bisneto, o Inquisidor João Álvares Brandão. Afonso Brandão era descendente de famílias de grande fidalguia, estando a sua ascendência referida, por Manuel Rosado Vasconcelos, até Paio Gonçalves que viveu em Midões em 1131.

Casou em Travanca de Lagos em 1485 com Catarina Vaz, daí natural. Teve um filho chamado João Álvares Brandão, Juiz em lagares da Beira, sendo referido como homem honrado, mercador, dos principais do concelho. Este casou 2 vezes, a 2ª com Catarina Álvares, natural de Midões. Do casamento resultaram 4 filhos, com larga geração em Travanca e à volta do concelho (Sameice, São Romão, etc.). Esta casa foi provavelmente residência desta família por mais de 400 anos. Entrou em declínio e viria a ficar em ruínas no início do séc. XX.

Condessa de Camarido em Travanca de Lagos

A data desta foto é de 1950. Na década de 60/70, a casa foi adquirida em hasta pública por Fernando Matias, natural de Travanca, tendo-a reconstruído de raiz (e que depois alugou `a minha avó - Maria Cerca). O facto da casa ter chegado a este ponto, pode estar relacionado com o complicado processo de partilhas da Condessa de Camarido. Segundo consta em documentos encontrados, pelos proprietários duma outra casa pegada a esta, também bastante antiga, que mantêm nos registo as antigas confrontações, confrontava com Condessa de Camarido. Ou seja, esta casa fazia parte da vasta herança da condessa de Camarido. À sua morte, a casa provavelmente já estaria numa fase de declínio, acabando por ficar em ruínas, e só quando se tornou um perigo público aos transeuntes terá sido vendida.

Dona Maria Isabel Freire de Andrade e Castro (1836-1905), herdeira das Casas de Bobadela e Camarido, 2ª Condessa de Camarido, que casou aos 17 anos com o seu tio paterno, Bernardim Freire de Andrade e Castro (1810-1867), Alferes de Cavalaria, Moço-Fidalgo da Casa Real, Comendador de Terena, na Ordem de Aviz, filho dos l°s Condes de Camarido. Camarido é uma zona de floresta na foz do rio Minho. O título foi criado por D. João VI e concedido por Decreto de 1822 a Nuno Freire de Andrade e Castro, para relembrar o feito de seu irmão, Bernardim, que nesse local resistiu heroicamente ao exercito Napoleónico.
Não tendo tido filhos de seu casamento, a Condessa de Camarido - a tia Patrocínio, segundo especialistas queirosianos, do romance “A Relíquia” -. faleceu viúva e sem geração, deixando os seus bens a instituições religiosas. Pela sua relação com um padre, que tinha um enorme ascendente sobre ela, acabou por passar quase toda a fortuna para a congregação a que ele pertencia, a do Espírito Santo. A família impugnou e houve um processo muito complicado.

Hoje a casa tem novos proprietários, herdeiros de Fernando Matias. O granito mantém-se mas sem o esplendor de outros tempos, que aliás, eu nunca conheci.
(bibliografia- "Raízes da Beira)

sexta-feira, 29 de agosto de 2008

Fotografias antigas




Este novo tópico é um espaço de partilha. É um desafio a todos os conterrâneos, especialmente aos mais velhos. Tenho várias fotos com pessoas de Travanca, que desconheço quem sejam. O desafio é ajudar-me a descobrir quem está nas fotografias. Seguramente, neste caso, será uma familia de Travanca, dos primeiros anos do séc.XX. Deixe um palpite no tópico - comentários - desta mensagem.

quarta-feira, 27 de agosto de 2008

Travanca de Lagos – Uma viagem pelo tempo

Postal antigo 

A ocupação humana do território deverá ser bastante remota, a julgar, primeiro pela proximidade da Bobadela, antiga cidade romana - a splendidissima civitas - por outro lado a existência da Anta do Pinheiro dos Abraços junto a Travanca, e de outros monumentos megalíticos nas freguesias vizinhas. A base de dados do IPA regista a existência em Travanca de Lagos duma Anta, período Neo-calcolítico, mas sem qualquer anotação de trabalhos ou estudos.
Na freguesia existem ainda, muitas sepulturas rupestres e restos de necrópoles da Alta Idade Média e até, possivelmente, pré-históricas. Segundo consta na Grande Enciclopédia Portuguesa e Brasileira terá havido por aqui povoamento já há cerca de 5.000 a 6.000 anos.

O 1º e mais antigo documento escrito na história do actual concelho de Oliveira do Hospital e que faz referência a Travanca é uma ”carta de testamento” de uma tal Múnia ou Muna, datada de 22 de Janeiro de 969, mostra que ela doa ao Mosteiro do Lorvão os bens que tinha entre o Mondego e o Alva, especialmente Midões, Touriz e Flamianes ou Framiães na margem do Alva, e aí se diz que Midões com Touriz confronta com a “villa” (rústica) de Travanca.

A acção repovoadora do Mosteiro do Lorvão, instituição robusta, fundada no último quartel do séc.IX pouco após a tomada de Coimbra em 878, por D. Afonso III de Leão, estendeu-se por uma vasta região que ia de Ceira e Serpins a Penacova e Gondelim na foz do Alva, a Miranda do Corvo, tendo a população cristã chegado a Mucela e Sarzedo, Santa Comba Dão, Midões e Travanca e outras terras, e por toda esta extensa área a população estabilizou, fundaram-se igrejas, cultivavam-se tractos e courelas.

Mas o domínio cristão na Península continuava instável, já por disputas entre os chefes e os condes cristãos, já por acção dos muçulmanos. O Rei Garcia, rei de Leão, morre em 914 e sucedeu-lhe Ordonho II que governava a Galiza, ficando assim reunificados estes dois reinos, que, dentro em pouco, passaram a chamar-se unicamente Reino de Leão (embora, temporariamente, a Galiza viesse a estar novamente independente com Sancho até à morte deste em 929, quando o rei de Leão era Afonso IV, seu irmão). Por esta altura, territorialmente e politicamente a região das Beiras era Reino de Leão.
E, com efeito, não se encontram notícias de incursões ou combates com muçulmanos na região que possa corresponder a Seia, Oliveira do Hospital, Vale do Alva ou redondezas por esses tempos de 911 a 937 mesmo nas décadas mais próximas seguintes.

O segundo documento mais antigo a mencionar Travanca é uma Carta de D. Afonso Henriques de 20-3-1133, de coutamento de Midões ao já dito Mosteiro do Lorvão. Volta a citar-se esta terra ao traçarem-se os limites e de novo se refere a tal arcana: “dividit Midones cum Teorice (Touriz) et inde per illa arcanam que est inter Midones et Travanca”. Ainda no séc. XIII se cita em Travanca o lugar chamado Pedra de Tom “- “termino de Travanca in loco qui dicitur Petra de Tono” – com possível interesse arqueológico.

Nos primeiros tempos da Nacionalidade, Travanca era terra do termo de Seia, uma possessão do rei sob o domínio directo da Coroa. Segundo as actas das Inquirições de 1258, era terra reguenga, tendo um celeiro real, chamado cellerium, onde se entregavam os foros ou tributos da coroa. Lá vem referido também que a terra e a igreja eram possessões da Coroa. No campo eclesiástico, era Paróquia do Arcebispado de Seia. No Arrolamento Paroquial de 1320-1321, a igreja aparece expressamente denominada “de São Pedro de Travanca da terra de Seia” .

Na parte final do séc. XIV, D. João I deu a Gomes Freire de Andrade o senhorio da Bobadela, Travanca, Lagos e outras terras na Beira. Era ilho de Nuno Freire de Andrade, fidalgo vindo da Galiza, que também se ligou a Beja, de quem o rei tinha recebido importante serviço.

A partir de D. João IV, que criou a casa do infantado (1654), o senhorio das terras da Bobadela, Travanca e Lagos passaram ao proveito desta instituição, isto é, a terras do Infantado.

Mais tarde,Travanca, Negrelos, Andorinha, Covas e Balocas, passam a fazer parte do mesmo concelho de Lagos da Beira, concelho que se caracterizava por ser territorialmente descontínuo. A Justiça tinha sede em Lagos da Beira embora a parte administrativa e reuniões de câmara fossem realizadas em Travanca.

Já assim acontecia quando D. Manuel l concedeu Foral a Lagos em 15-3-1514. Andorinha chegou a pertencer ao antigo concelho de Midões e o concelho de Lagos veio também a integrar Santo Amaro.

Extinto o concelho de Lagos, tanto este como Travanca, que dele fazia parte, foi anexado ao de Oliveira do Hospital, por Dec. de 6-11-1836.

JDuarte

segunda-feira, 4 de agosto de 2008

Poesia e Património lV

MEDIEVAL

















Oh Travanca, que império!
Estás envolta em mistério.
Tanta campa edificada,
Tanta morte sacralizada!
Onde estão teus trovadores?
Eles que nos contem as tuas dores…


Tantos séculos de história,
Tragédias vividas, amor e glória.
Hoje só nos chega o teu granito,
Falta a voz do teu passado, um grito!
Oh Travanca, que inglória!
És um povo sem memória.


JC Duarte

domingo, 3 de agosto de 2008

Crónicas da minha terra, CAP. I


A TUNA DE TRAVANCA DE LAGOS

Poucos são os que olhando para esta fotografia conseguem identificar alguém. Bem, olhando com mais atenção, reconhece-se ali no meio a cara do Manso, sim, mas do Manso pai. Na verdade esta fotografia data de 1929/30, assim o diz António Pereira, o então miúdo, que se encontra mais à direita da fotografia, que junto com o seu irmão, José Pereira, são os últimos testemunhos vivos deste histórico momento fotográfico.
Fiquei muito admirado quando me garantiram que esta fotografia era de Gente de Travanca. Não podia acreditar pois desde miudinho que vou a Travanca e nunca tinha ouvido falar em tal. De manifestações culturais, tirando as festas de São Pedro e um grupo de teatro criado nos anos 80, havia pouco, era um vazio cultural. Por sinal esse grupo de teatro era muito bom, dinamizado pelo então pároco da aldeia, padre Manuel, que nesse tempo “mexeu”muito com a povoação. Produziram-se algumas peças, sobretudo comédias, em que as estreias representavam casa cheia, um autêntico acontecimento local com toda a povoção a assistir.
Em poucos segundos Travanca mudou radicalmente para mim - senti a sua história, o seu passado! Tudo à volta passou a ter um outro significado, as casas, as ruas, os cantos e recantos, senti que a nossa Terra já teve outros protagonistas, muitas histórias, que porém já não se contam, mas fica a ideia de outros tempos....
Foi no café do Entroncamento, onde estava pendurada esta fotografia, devidamente emoldurada, que tive este primeiro encontro místico com o passado. Perguntei ao Sr. Neto, que é o actual arrendatário do café, se a fotografia representava alguém de Travanca. Respondeu-me que sim e que todos os que constavam da fotografia já tinham sido identificados. O Sr. Ivo era talvez o único que a conseguiria decifrar, referindo que também ele constava nela, e ainda hoje já perto dos oitenta anos ainda tocava bandolim a convite de outras terras. Desconhecia estes factos, mas lembro-me do filho Carlos, este mais do meu tempo, que tocava bem viola.
Pedi emprestada a fotografia para tirar uma cópia, sentei-me com ela no café do Osvaldo, no povo, não arredando pé até chegar o Sr. Ivo, que dizem, parava por lá habitualmente à tarde. Esperei ansioso por ele, sentia que tinha a missão de perpetuar aquela memória de Travanca, de fazer história.
Por fim chegou. Era a mesma figura que conhecera desde sempre, pouco tinha envelhecido e após nos cumprimentarmos, sentámo-nos autenticamente agarrados à fotografia. Começou por referir que fez parte da Tuna de Travanca, assim chamada, mas que naquele ano ainda não tinha entrado, tinha apenas 7 anos. Retirou os seus óculos, que para ver ao perto de nada servia visto ser alto míope, mas pouco reconheceu por ver muito mal. Disse para esperarmos pelo irmão, o já mencionado Sr. António Pereira, que estaria também a chegar e ele sim poderia identificar todos, estando ele próprio na fotografia.
Quando o Sr. Pereira chegou, pedi-lhe que nos ajudasse. Prontamente aceitou. Conjuntamente com o irmão, o Sr. Ivo, iniciámos a aventura de decifrar todos os elementos da fotografia. Para eles era como voltar à sua infância. Para mim foi um misto de contentamento e de dificuldade em registar todos os nomes e relações, assim foi o ritmo da nossa conversa. Como se chamavam, o que faziam, onde viviam tudo saltava num frenesim diabólico.
Peguei numa folha de rascunho e desenhei vinte e quatro bolas – tantas quantas eram as pessoas e no alinhamento em que se apresentavam na fotografia, que era para não me enganar – e fui escrevendo o que iam dizendo freneticamente. Repetiam algumas vezes a meu pedido.
Em cima, da esquerda para a direita, começaram por dizer, estava António Baeto – que era quem transportava a caixa com os papéis de música – depois vinha António Pereira Marcos, tocava viola – segue-se António Santos Viegas na flauta, Adelino Prata, electricista, também na flauta e Fernando Lopes Monteiro no Bandolim – tornou-se bancário em Lisboa – depois Mário Bandeira no Banjo, Feliciano Mendes Borges ao Violino – Feliciano do Queijo, tinha um armazém - e António Brito Martinho também ao violino. Por fim, em cima, Carlos Ribeiro Pina que tocava bandola.
Ao centro, também da esquerda para a direita, está Armando Brito que tocava Bandolim, depois, ao que parece sentado, está Manuel Miguel na viola – vivia e era comerciante nas Campas, depois foi para África – a seguir vem António da Felicidade – meu tio, irmão do meu avô, tocava viola, seguindo-se Manuel Martins Borges, António Mendes Borges (o Manso), Sérgio Nunes Pereira - Irmão do Sr. Ivo e do Sr. Pereira, referindo que morreu muito novo, aos 20 anos – e Basílio Lopes Monteiro , que vivia na actual casa em ruínas junto à fonte de Baixo - todos tocavam viola. Por fim ao centro vêem os nossos testemunhos, os irmãos José Teles Nunes Pereira, ao Bandolim e António Nunes Pereira também ao bandolim e mais tarde ao violino, segundo diz.
Em baixo, sentados com os instrumentos aos pés, estão os Órgãos directivos, pessoas ilustres da terra, que suportavam economicamente a tuna e que provavelmente dariam também algum prestígio ao grupo. Então da esquerda para a direita, vem Batista Lemos – que era embarcadiço em Angola e morava na casa branca pegada à Fonte de Baixo – depois o Sr. mais idoso da fotografia era  Luís Martins Borges – pessoa ilustre e benfeitor de Travanca, que vivia no Entroncamento, na casa conhecida atualmente por casa do comandante, junto à rua com o seu nome – seguindo-se José Pinto Ribeiro, o Mestre da Tuna. Ao lado estava José Brito, o presidente da direcção da Tuna e também presidente da Junta de Freguesia nessa altura – era proprietário de uma agência de viagens em Oliveira do Hospital (Agência de Passagem e Passaportes) – e Diamantino Marques Neto, que vivia entre "a casa do Renato" e os jardins da actual junta de freguesia. A sua filha, D. Piedade era casada com um irmão do Comendador Costa Carvalho, também figura ilustre de Travanca. Por fim, está o Sr. Morgado que era ferroviário, desempenhando, segundo o Sr. Pereira, um cargo de chefia.
Fica assim relatada esta memória histórica, para o povo de travanca, que de outra forma poderia perder-se para sempre.
JDuarte

Crónicas da minha terra, CAP. II

Travanca de Lagos


Só depois de me ter interessado pela história de Travanca, o que de uma forma consciente é relativamente recente,  me apercebi de quanto é  difícil  conhece-la.  Existe pouca matéria  editada que fale de Travanca, talvez apenas existam alguns documentos soltos, mas que é preciso encontrar  e há pouca informação disponível na Web, facto que me deixa bastante triste. Sabendo que um dos processos de obter   informação é junto das pessoas, mais concretamente junto das mais idosas,   pensei  num plano  de recolha de informação, que passaria pela  recolha de  testemunhos e de possíveis documentos, obtenção de fotografias , etc., e com base nisso iniciar um processo que me permitisse ir reconstruindo o passado de Travanca .

A primeira pista levou-me a conhecer vestígios remotos de uma civilização antiga na freguesia – Sepulturas cavadas na rocha, no sítio do  Gorgulão, em Negrelos (freguesia de Travanca de Lagos) . Foi uma autêntica visita guiada ao local, que por gentileza do seu proprietário , o Sr. Carlos Martins, pessoa muito interessante e também apaixonado pela história, proprietário de um simpático café no Pinheiro dos Abraços,  palco de passagem e de  encontros,  me deu a conhecer a sua propriedade e algumas propriedades vizinhas, cheias dessas reminiscências do passado. Fiquei espantado e maravilhado com todo aquele arquivo histórico natural, parecia que estávamos a desenterrar uma cidade antiga perdida na floresta . As Sepulturas como estavam cheias de sedimentos pedi-lhe  para voltar noutra altura e então tirar algumas fotografias. Na verdade voltei ao local mais duas ou três vezes, tendo numa delas levado alguns ajudantes exploradores, para me auxiliarem na custosa tarefa de limpeza das áreas a fotografar. É sobre esse dia que reportam as imagens que se seguem:


Fig. 1 e 2 – Monólito de possível posto de vigia


Fig.3, 4 e 5 – Megálito representando um Conjunto




Fig. 6 e 7 – Megálito de uma possível habitação ou abrigo




Fig. 8 e 9 – Pormenor dos estancamentos

Fig.10 – Monólito com uma morfologia interessante



Fig.11, 12 e 13 – Construção granítica de habitação antiga, já em ruínas, entre dois megálitos, um dos quais com uma representação de conjunto e o outro com um pequeno santuário, de origem e data desconhecidas.





Fig.14 e 15 - Pormenor do santuário





Fig.16, 17 e 18 – Fornos medievais, possivelmente para cozer barro.





Fig.19 – Inscrição, sugerindo ser um termo de terras de infantado, segundo Correia das Neves.


Fig.20 – Eu e a minha equipa de exploradores




sexta-feira, 1 de agosto de 2008

Poesia e Património 3

INVOCAÇÃO



















Procuro nas ruelas apertadas,
Espreito entre grades e ameias,
Toco no granito frio e apagado,
Ando pela calçada já gasta,
Polida pelo tempo e por desgraça
De figuras sofridas de preto.


Ouço vozes que vêem de longe,
Olho por entre janelas de cantaria chanfrada,
De dentro, voltam sombras do passado!
Figuras antigas, esquecidas pelo povo injustamente?
Procuro sinais do tempo que me digam,
Porque não se fala delas…


Ao longe vejo João Alvares Brandão,
Senhor da Casa de Travanca e sua mãe Catarina Vaz.
Vejo uma carroça antiga e bonita,
Puxada por um cavalo branco!
Relincha à varada no dorso e parte ensurdecedor,
Pelo outeiro repisado das ferragens.


Sento-me num marco de pedra,
Talhado já por mãos longínquas,
Tão antigo e só, que a história não o reconhece.
Foi outrora coluna da Splendidissima Civitas!
Sobre a ruína erguem-se novos frutos,
Cada pedra encaixa noutra charada.


Casas sobrepostas em becos cruzados,
Valetas centenárias por onde correm fluidos,
Os cheiros sinistros e intensos do ar.
Por detrás de uma cancela velha,
Descobre-se um pormenor interessante,
Que anuncia histórias e vidas por contar…


Oh! Mensageiro do tempo falido,
Enviado de veneráveis antepassados,
Portador de passos esquecidos!
Sossega a minha inquietação,
Revela-me os segredos perdidos…
JC Duarte

Poesia e Património 2

CASITA DAS CAMPAS



Num lugar da nossa história,
Velando campas esquecidas,
Ao fundo do lugar, em glória,
Testemunha memórias idas.


O granito do alpendre discreto,
Ao largo de quelhas pisadas,
Vigia quem passa perto
Guarda as almas abandonadas.


Num confronto não perdido,
Virado para quem passa,
Luta com um cruzeiro polido
P’lo protagonismo da praça!


E nesse confronto infinito,
Sem perder a sua graça,
Resiste ao tempo o granito
E vence ao cruzeiro a praça.
JDUARTE

sexta-feira, 2 de maio de 2008

Poesia e património 1

NEGLIGÊNCIA




Uma casa abandonada para sempre…
Com memórias e tantas vidas lá passadas,
Jamais nos permite seguir essas pegadas
Perdidas neste tempo eternamente.
Mas, testemunhos mudos à espera dum momento,
Revelam-nos os segredos de antigamente.

Uma casa perdida para sempre...
Quinhentista, em granito imponente,
Sobre o largo uma escadaria decadente!
Foi em tempos senhorial e respeitada.
E tudo o que chegou foi tão pouco…
Apenas ruínas, sem legendas nem nada.


Uma casa abandonada e perdida para sempre…
Numa terra abençoada p´la sua gente!
Que faz a ponte do passado para a frente.
Como pôde não perceber o legado!
Caída para sempre duma guerra perdida,
Não esperava do seu povo gesto errado.


Foi reedificada já pouco restava,
Perdeu a alma, não ficou nada…