segunda-feira, 14 de abril de 2025

Lanzner - vida e obra

Lanzner, 1936-2013

 

Lanzner, nome artístico de António Luís da Silva Reis Santos, faria 89 anos em 26 de março do presente ano. Esta é uma efeméride que recordo com saudade. Foi um artista plástico de Coimbra.

Expôs individualmente pela 1ª vez na Galeria, O Primeiro de Janeiro, em Coimbra, corria o ano de 1959 e pela última vez em 1989 na Galeria Estúdio Arte, em Coimbra também. Ainda em 1993 realizou uma exposição didática de gravura com o Monsenhor Nunes Pereira. Foram mais de 30 anos dedicados às artes plásticas, do desenho à gravura e à pintura, da escultura à medalhística. Pelo meio realizou muitas exposições, dedicou-se ao ensino como professor de desenho na Escola Brotero e no Circulo de Artes Plásticas, esteve em Paris como bolseiro da Fundação Calouste Gulbenkian e criou uma vasta obra artística, permanecendo ainda um acervo considerável na família.

Lanzner foi um artista completo, que abarcou todos os domínios artísticos e que se manifestava quer no processo criativo como nos meios de suporte à criação. Era detentor de uma cultura vasta e diversificada que lhe permitia grandes conhecimentos e uma grande liberdade nos meios e técnicas de produção artística. Foi ele que fez o prelo para impressão das gravuras, o forno para aa fundição das medalhas e outras peças, os cavaletes, as malas de transporte de quadros e materiais, por vezes as tintas e os pincéis, as molduras e os catálogos das exposições. Produzia a arte e os meios artísticos, era todo o processo que lhe permitia tirar todo o prazer da arte.

Conviveu com grandes criadores, escultores, pintores e artistas do séc. XX, fruto da relação privilegiada que o seu pai, Luís Reis Santos, mantinha com o meio artístico português, tendo sido ele um reputado historiador e crítico de arte dos meados do séc. XX. Dórdio Gomes, Martinho da Fonseca, Watanuki, Cottinelli Telmo, Leopoldo de Almeida, Barata-Feyo ou o mestre António Duarte são alguns exemplos, assim como Carlos Queiroz, seu padrinho de batismo. No meio artístico de Coimbra conviveu com Hébil, António Pimentel, Pinho Diniz, Mário Silva, Pedro Olaio Filho, Monsenhor Nunes Pereira, os irmãos Berardo, entre outros e numa fase mais tardia com o pintor Vítor Matias que tinha um atelier/galeria no Girassolum, a Galeria Estúdio Arte, onde ele expunha habitualmente algumas obras e que era palco de tertúlias diárias, nos corridos anos 90, junto com o seu amigo Hébil, Mons. Nunes Pereira, entre outros, como Vasco Berardo ou Zé Penicheiro.

Nos últimos 20 anos da sua vida, envoltos em progressivos problemas de saúde e, de certo modo, desiludido com a pintura e o meio artístico coimbrão, dedicou-se à escrita, especialmente à poesia, mas também à prosa e aos ensaios filosóficos, deixando vários livros prontos a publicar. Nessa derradeira fase o músico e poeta Eduardo Aroso foi o seu grande amigo e companheiro de escrita e tertúlias.

Pessoalmente, conviver com o Homem e o artista foi uma grande inspiração e talvez o responsável pelo meu atrevimento no domínio artístico. Foi um Mestre.

Neste espaço pretende -se divulgar a sua obra, embora de uma forma sumária e temática, com relevo para o Desenho, para a pintura e gravura, escultura e medalhística.


terça-feira, 1 de abril de 2025

Travanca à mesa

 

Fig. 1 –Natureza morta, òleo sobre platex, Lanzner, anos 60


A Travanca de Lagos, como à Beira Alta de uma forma geral, são-lhe reconhecidas as qualidades de hospitalidade e de boa mesa, factos que tenho confirmado ao longo dos anos. Ora, esse último aspeto será o tema deste pequeno tópico a que voltarei variadas vezes, tantas quantas as vezes que eu perceber que a divulgação do estabelecimento, da iguaria ou do cozinheiro seja relevante para quem nos visita. Poder percorrer a história e o património da nossa região e complementar o passeio com um rico repasto regional é um complemento que se torna essencial, afinal, a gastronomia faz parte da nossa cultura e é um selo da nossa região.

As gentes da Beira são simpáticas, gostam de receber bem e tradicionalmente têm uma cozinha rica e saborosa. Os produtos regionais são amplamente conhecidos, como o queijo de ovelha Bordaleira, conhecido como Queijo da Serra da Estrela, o requeijão desse mesmo leite, os enchidos de porco, como a morcela, a chouriça e a farinheira ou os míscaros, estes últimos mais raros, talvez por razões de segurança alimentar, são alguns exemplos de excelência. Os pratos de cabrito assado à moda da Beira, os torresmos, o arroz de cabidela, o entrecosto de vinha de alhos são algumas receitas conhecidas. O pão-de -ló que acompanha o queijo, o arroz doce e a tigelada são típicos da região. A broa de milho e a bola de sardinha feitas em forno de granito dão -lhe um sabor especial. O vinho é afamado estando inserido na região do Dão. As castas touriga Nacional para as uvas tintas e o encruzado para o vinho branco são as mais conhecidas.

Infelizmente não há muitos restaurantes a considerar, encontrando-se apenas 1 em travanca que operara por marcação, conhecido pela Tila, de resto, afamado pelas gentes que nos visitam, tendo na sua qualidade /preço e na generosa quantidade a sua mais-valia.

Travanca desde que há registos conhecidos, nomeadamente nas inquirições Afonsinas e por altura do Terramoto de 1755, que é referido travanca como sendo uma terra de poucos recursos, um solo pobre, pouco gado, onde a pouca caça se limitava aos coelhos do mato, que ainda assim eram pouco aproveitados. Como hipótese para esse visível exagero talvez se possa pensar que este relato pudesse servir aos proprietários de então, que dessa forma podiam evitar a cobrança de mais impostos ou tarifas, desviando assim a atenção sobre a aldeia, podendo ser vista como uma medida protecionista. Verdade ou não, sempre se caçou nas nossas terras e presentemente também se juntam ao coelho e aos tordos, o javali. A gastronomia de caça será portanto considerada como tendo tradição nas nossas terras e dado algum destaque.

É um desígnio desta rubrica encontrar quer os restaurantes que respondam ao bom paladar e que estarão ao alcance de todos de uma forma geral, e aos cozinheiros amigos que têm o dom e eu o prazer de ir conhecendo, e que se prestem a mostrar as suas qualidades gastronómicas. Será portanto um espaço de divulgação da nossa cultura gastronómica e um incentivo à descoberta da nossa região, a par das histórias, da cultura e do património.


sábado, 8 de março de 2025

À minha Mãe

 

Fig. 1 – Flora, a minha mãe com 20 anos


Neste espaço que dedico às memórias do passado de travanca, quero partilhar uma muito especial e pessoal, a história de vida da minha mãe. Não porque tenha tido relevância no panorama de Travanca de Lagos mas porque teve toda a relevância e importância na minha vida.

Foram 83 anos de vida, para nós partiu cedo deixando um grande vazio nas nossas vidas, mas com a convicção de ter partido de coração cheio. Voltou para a Terra que a viu nascer, num lindo dia de sol, 4 de março de 2025, junto com a família, amigos e conhecidos e acompanhada pela secular Irmandade de São Pedro. A todos agradeço por essa última homenagem!

Como sabem, a minha mãe chamava-se Flora (fig.1), um nome diferente mas que sempre adorei! A inspiração para o nome, segundo sei, foi de uma amiga brasileira da minha avó Maria Cerca, chamada Flora (fig.2), que estaria temporariamente na casa de Luís Martins Borges, onde a minha avó trabalhava. Teve 3 irmãos e um pai que se ausentou quando ela tinha apenas 2 anos.


Fig. 2-  Flora
         Fig. 3 -  Entroncamento, fins dos anos 40 ( a minha mae, 2ª da dta.)


A nossa família vivia um período muito difícil de privação e pobreza, num país pobre e num contexto de 2ª guerra mundial e pós guerra. Talvez por isso saiu ainda muito nova de travanca, com apenas 9 anos, foi servir para a família do Dr. Álvaro Madeira em Coimbra- hoje seria considerado trabalho infantil - pouco tempo depois de concluir a escola primária. Teve portanto uma infância pouco feliz e uma vida difícil nos primeiros anos.

Fig. 4 – Aniversário dos 59 anos de casamento, 29/8/24

Mas cedo encontrou um novo rumo, quando conheceu o grande amor da sua vida, um homem que a amou desde o primeiro dia e que levaria a uma vida comum de mais de 60 anos. Foram um binómio até ao último dos seus dias, um amor incondicional. Quem os conheceu sabe do que falo, os meus pais foram feitos um para o outro!


 

Fig.5 – Dia do seu casamento, 29/8/65                                                  Fig.6 –Fim dos  anos 60

A sua vida não aconteceu sem sacrifícios, trabalhos menos qualificados, passando por um período de emigração na Alemanha, onde trabalhou, entre outros, numa fábrica de produção de peças automóveis, em schaffausen, perto de Singen, cidade do sul de Alemanha, onde residíamos. Não deixaram de ser tempos felizes também, com muitas amizades novas num país de novas oportunidades.

Fig. 7 – Alemanha , Singen 1977

De regresso a Portugal, estiveram para se fixar em Travanca, mas acabaram por escolher Coimbra, a sua terra de coração, corria o ano de 1979. Aí construíram uma moradia, na Casa Branca, bairro da Monac, como era designado então, chão de antepassados meus. Aí viveu cerca de 45 anos até ao seu último dia.



 Fig. 8 – Colegas do Jardim                                      Fig. 9 – Um dia de trabalho no João de Deus, 1999

Em 1980 foi inaugurar o 2º jardim-escola João de Deus, na Solum, primeiro como empregada mais básica e finalmente como chefe de economato, cargo que desempenhou até à sua reforma em 2006. Criou muitas amizades entre colegas e professores, pais e educandos. Eu costumava dizer que a minha mãe tinha muitos netos em Coimbra para além dos seus, pois mantinham-lhe o afeto muitos anos depois de saírem da primária, com visitas constantes. Quando fez 25 anos de serviço foi agraciada e homenageada na sede em Lisboa pelo presidente da direção da Associação de jardins-escolas João de Deus, o Dr. António de Deus Ramos Ponces de Carvalho, que a deixou muito orgulhosa. Mas acima de tudo trabalhou para os filhos e netos, 4 que ajudou a criar, com muita dedicação e um amor incondicional. Todos temos memórias maravilhosas.

Fig. 9 – Homenagem em 2005


E como não podia deixar de ser, filha de cozinheira sabe cozinhar! Cozinhava maravilhosamente, eram conhecidos por toda a família e amigos os seus pratos de cozinha tradicional Portuguesa, como o rancho, a feijoada, o cozido ou o cabrito assado, que não tinham igual. Dou 2 exemplos: feijoada com arroz de bacalhau e esparregado de nabiças, parece estranho mas era sublime ou a típica carne estufada com cenoura e nabo, simplesmente divinal! Já os netos e os seus amigos não esquecem as almondegas e os morangos com chantilly!

 
 

Fig.10 a 13 – últimos 2 anos


Nos últimos anos, fruto de um processo demencial, a sua saúde foi-se deteriorando progressivamente, embora que, até ao seu último dia tenha mantido sempre a boa disposição junto da família e principalmente do meu pai, agora também o seu cuidador extremoso, que nunca lhe faltou com amor nem coisa alguma. Apagou-se a luz mas ficam as memórias de todos nós!


Fig. 14 – Último aniversário 12/11/2024


segunda-feira, 24 de fevereiro de 2025

Figuras do meu tempo

 



Fig. 1 – Retrato com cerca de 19 anos




Maria Cerca

Chamava-se Maria dos Anjos Costa, e já nos últimos anos de vida perdeu o Costa ficando apenas Maria dos Anjos, era a minha avó Maria, conhecida por todos como Maria Cerca. O apelido vem já de família, já a mãe, minha bisavó, era a Cerca. Os Cercas têm origem na Quinta do Pedrógão, talvez tenha começado por uns tios, Maria da Nazareth Costa e José de Abrantes por terem sido moradores e trabalhadores na Quinta da Cerca, em meados do séc. XIX.

Fig.2 – À soleira nas escadas de sua casa, anos 80


Teve uma vida difícil, mãe de 4 filhos, um, o meu tio Vasquito, faleceu com apenas 14 anos, facto que lhe deixou marcas para sempre. Embora casada até ao fim dos seus dias, ficou mãe solteira e desamparada muito cedo, com apenas 25 anos. O meu avô saiu de casa e acabou por ter uma vida paralela, com filhos, perto de Serpins. A família não a ajudou, foram para o Brasil e quando parte regressou continuou sozinha na labuta pela sobrevivência. Fez vários trabalhos para conseguir sustentar os filhos, chegou a vender pão na feira, mas foi como cozinheira que ficou conhecida. As filhas foram servir como empregadas de famílias abastadas ainda crianças. Eram tempos difíceis…

Fig.3 – Uma Boda de casamento nos anos 80


Como Cozinheira que foi, afamada nesse tempo, fez as bodas de casamento de grande parte dos residentes de travanca da sua geração, nomeadamente nos anos 60, 70 e 80, e participava noutras festas consoante houvesse necessidade e para isso fosse requisitada. A fig. 4 mostra um dia de festa e a minha avó é a terceira pessoa que se encontra à direita em pé, com os braços apoiados sobre os ombros do Sr. Nunes Moleiro. Foi a cozinheira da boda de casamento da irmã da D. Conceição Brito, Mª Isabel Mendes Costa e Silva Mesquita, sobrinhas do Proprietário José da Silva Neto. Na foto constam, em grande parte, os colaboradores /trabalhadores da quinta do Sr. Silva Neto, que comiam numa ala à parte, como era hábito na época. Muitos destes travanquenses já faleceram, alguns não se identificaram, mas é um belo retrato de época!

Fig. 4- Ala dos empregados da quinta de José da Silva Neto na boda de casamento da sobrinha, D. Isabel Mesquita, 1967


segunda-feira, 17 de fevereiro de 2025

Figuras do meu tempo

 Mário Sapateiro


O Sr. Mário Santos, conhecido como Mário Sapateiro, por ter sido essa a sua profissão, ele que foi o último a exercer essa arte com sede em travanca, era uma figura afável e muito simpática. Prestava o serviço onde tinha a sua oficina, no r/ch da sua residência. E era por ali que se encontrava normalmente, ou a trabalhar na arte, ou a conversar com os amigos que por ali passavam, como eu por exemplo, ou o seu vizinho Horácio Rato.
Fig. 2- Cabana de apoio

Também trabalhava na lavoura como grande parte dos travanquenses da sua geração e tinha especial orgulho na sua cabana de pedra situada junto à Mata do Búzio, que lhe servia de apoio para guardar as alfaias. Era um enorme megálito de granito transformado em abrigo, que ele teve o gosto de me mostrar. Tinha também essa característica, servir de cicerone pelas maravilhas escondidas de travanca. Foi ele que me mostrou em primeira mão os megálitos com interesse histórico no Búzio e até onde se situavam as Casinhas do Diabo que, envoltas em mato cerrado, eram difíceis de encontrar.

Fig.3 –à procura das Casinhas do Diabo
Fig. 4- A contar a pré- História do Búzio

 

As Casinhas do Diabo que faziam parte do imaginário das crianças de Travanca da minha geração, ao estilo dos contos populares infantis medievais, que amedrontavam e simultaneamente enalteciam a coragem de quem ousasse enfrentar. Foi o que aconteceu certa vez, com o meu tio António Antunes, numas férias de verão que passámos juntos com a restante família. Entra pela caverna, comigo e outros a ver amedrontados, ouvem-se gritos e sinais de luta lá dentro e finalmente sai com a camisa meio rasgada ou desgoelado, depois de ter enfrentado a fera, dita o Diabo em pessoa! Para nós, se não acreditássemos passava-mos a acreditar, tal fora o teatro daquele ato. Provavelmente faziam isso para perpetuar o mito para as novas gerações. Tudo isto na Mata do Búzio, mata que o incendio de 2017 infelizmente fez desaparecer.

 Fig.5 – As Casinhas do Diabo, aspeto exterior

Fig.6- Pormenor do interior 

Era majestosa, com os enormes pinheiros mansos de copa bem alta, por entre as altas lajes de granito que serviam de miradouros para a aldeia e para a serra, tanto do caramulo como da Estrela.

Fig.7- Um miradouro na mata do Búzio


Fig.8- Mata do Búzio, pormenor

O Sr. Mário Sapateiro era também conhecido em travanca, por mera brincadeira, como “O Primo”, pois via sempre uma relação de parentesco entre todos, ou quase. Eu que sou um apaixonado por genealogia achava graça e cheguei a procurar o caminho do nosso parentesco. Ele só não sabia os nomes dos antepassados mas tinha uma espécie de instinto genealógico!



segunda-feira, 3 de fevereiro de 2025

Figuras do meu tempo

 

HORÁCIO RATO

Fig. 1 - No Café do Sérgio


O Sr. Horácio era um cartão-de-visita de travanca. Sempre pronto para mostrar os mistérios escondidos do vasto património rupestre da nossa afamada terra. Foi o Sr. Horácio, com toda a sua simpatia e amabilidade que me foi mostrando as primeiras sepulturas antropomórficas, os primeiros lagares rupestres e outros locais interessantes, porque sabia que me interessava pela história de travanca. Nessa altura, quando me encontrava no Povo perguntava-me – Oh! Menino já conhece o sítio X? - E de seguida prontificava-se a mostrar-me a novidade por entre terrenos de cultivo e mato…


Fig. 2 - À procura da sepultura perdida
Fig. 3 - Nos Covais

Ele e o seu irmão, Manel Rato, eram distribuidores de pão em travanca, que o faziam, ele de mota e o Manel Rato de bicicleta, com um cesto bipartido nas traseiras dos velocípedes, conhecido por cesto de pernas. Embora houvessem mais padeiros, como por exemplo o Sr. António Brás. Paravam de porta em porta, pendurando os sacos com o saboroso pão feito em forno de lenha. Lembro me bem do som característico da buzina a avisar a sua chegada! Esse som característico que se mantem na minha memória e que só rivalizava com o toque do sino da igreja! 

O Sr. Horácio não só distribuía o pão como foi padeiro toda a sua vida, uma grande parte do tempo na padaria de travanca, propriedade, na altura, do Sr. Luís Tânica. E que saudades da nossa padaria e de comer o pão quente à meia-noite! Especialmente nas férias de setembro, quando em grupo tocávamos no vidro da porta da padaria, já com um pacote de manteiga na mão e amavelmente nos atendiam. De dentro vinha um bafo quente mas saboroso, muito característico. Nessa época não me recordo do Sr. Horácio por lá mas Lembro-me de ver muitas vezes o Sr. Zé Marques vestido de branco e com farinha da cabeça aos pés, a trabalhar arduamente e que o faria pela noite dentro, interrompendo apenas para nos vender os papos-secos quentinhos. E nós acabávamos a noite no cruzeiro a deliciarmo-nos com o pão quente com manteiga.

Fig. 4 - Manel Rato, junto ao pio da fonte Arcada

O Manel Rato foi também o sacristão de travanca, cargo que ocupou mais de cinquenta anos. Tinham também um outro irmão chamado Abel Rato que penso ter sido agricultor.



  

quinta-feira, 16 de janeiro de 2025

Figuras do meu tempo

 

Fig. 1 - Tonito Estoira

O Tonito Estoira, nome pelo qual era conhecido, para quem foi da minha geração, dispensa apresentações. Faz também parte das figuras incontornáveis dos últimos anos, e também um amigo. Tinha um jeito simpático de ser e de receber. A sua voz, embora carregada, muito rouca, era sempre acompanhada por um sorriso ou uma piada.

Sempre de pirisca ao canto da boca e um tintinho por perto, tinha sempre uma palavra amiga, era um brincalhão! Eu e o meu irmão tínhamos uma brincadeira comum com ele, que era empurrarmos o seu boné para trás, ou para a frente sempre que o víamos…ele não levava a mal, tentava agarrar o boné para não cair e respondia de imediato - ah! Galego! Traita…

Certo dia, estava ele nas escadas da igreja ao pé do cepo do Natal em brasa, com muita gente á roda e o meu irmão, à socapa, manda lhe a boina ao chão, que cai ao pé da fogueira, ficando chamuscada. Levou a coisa na brincadeira, como sempre, mas sempre que via o meu irmão dizia que lhe devia uma boina! Comigo aconteceu outra coisa. Ele tinha um isqueiro de petróleo, antigo, que troquei com ele por um eletrónico. Cada um pensou ter feito um bom negócio, eu porque fazia coleção de isqueiros e ele por ser uma coisa moderna mas, o meu rapidamente deixou de funcionar e ele chateava-me sempre que me via – Ah! Galego, ainda me deves um isqueiro!